Estava uma vez um riacho a pensar sobre todo o caminho de sua vida.
Buscava lembrar das origens de sua existência, das coisas pelas quais já havia passado desde o início, até chegar a sua situação atual.
Lembrou de quando era apenas algumas gotas, que brotaram milagrosamente de uma pedra e formaram uma pequena poça.
Depois lembrou de seus primeiros passos, correndo entre as rochas, chegando a terras mais baixas. Sempre buscando algo...
A medida que o tempo passou percebeu como ganhou corpo e a distância entre ele e as plantas a sua volta diminuiu.
Lembrou dos dias de chuva, quando seu corpo ficava feroz e instável, levando uma infinidade de coisas que por azar, estavam em seu caminho.
Lembrou de seus momentos de dificuldade, quando o implacável sol exigia todas as suas forças. Lutou para continuar como um pequeno filete de água a correr, sempre buscando algo...
Nesses momentos sentiu que talvez jamais voltaria a possuir caudalosas correntes, porém ele não desistiu.
Quanto mais suas águas corriam, maiores eram as dificuldades. Quando se aproximou do litoral, sofreu com a imundice despejada pelos egoístas seres humanos, que só pensam em si mesmos.
Mesmo com todas as dificuldades e peso morto, o riacho continuou a correr, sempre buscando algo...
As vezes era ajudado pela chuva. Mas sentia que conforme o tempo passava, suas águas corriam com cada vez menos força , ficando quase paradas devido ao lixo e a seca.
Viu se então nos dias de hoje, com suas águas escuras e sujas, se arrastando em meio a imundice.
Buscando algo... Sempre buscando algo...
Até que enfim ele encontrou. Algo que todo riacho sempre buscou, hoje busca e sempre buscará.
O mar... Um vasto oceano de possibilidades.
Ele pôde se perder para sempre nele, abandonando completamente sua antiga vida.
Mas eis que nas profundezas do mais remoto oceano, nas rochas mais antigas e na escaldante pressão nuclear da terra... Algumas gotas voltam a brotar por entre as rochas...
E novamente o ciclo se iniciou...
A vida, que é a atriz principal, pede novamente sua veste à natureza.
Porém a invejosa morte, credora universal, sempre a toma de volta.
No teatro do existir a vida sai de cena, como sempre, completamente nua...
Aos que desejam vida, dá-lhes morte. Aos que desejam morte, dá-lhes vida. Mas aos que desejam a libertação, ensina-os a estar além da vida e da morte.
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